A Gazeta do Middlesex

Homenagem ao Soldado Maia

9/2/2021

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             A   GAZETA   DO   MIDDLESEX
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​                            HOMENAGEM AO SOLDADO MAIA



​​Dizia-se que o Maia era o único soldado Cigano do Exército Português. Não era certamente verdade, mas eu gostava de acreditar que sim e que o tinha no meu pelotão. Tínha-o conhecido no Verão de 65 quando vindos de todo o país  centenas de jovens começaram a concentrar-se no Regimento de Cavalaria 7, em Lisboa. Todos sabíamos ao que íamos e o que nos esperava : Primeiro formar um Batalhão e depois embarcar para a guerra do Ultramar, como então era conhecida.

À medida que a instrução prosseguia  lentamente crescia o espirito de grupo e tornavamo-nos pouco-a-pouco numa unidade militar. No meio dos outros lá andava o Maia sem nada que o tornasse  digno de nota. Cordato, respeitoso, exprimindo-se bem, não faltou muito que perante a minha curiosidade me contasse a sua história:

Um belo dia, não há muito tempo, andava ele vendendo bugigangas porta à porta quando entrou no Quartel-General do Exército na esperança de fazer algum negócio. Ele há horas do demónio, como se diz, e a dele foi abeirar-se de um Capitão oferecendo a sua mercadoria. Este, olhando-o de alto a baixo, disparou: Olha lá meu rapaz, já foste à tropa ? Conta o Maia que ficou completamente estupefacto com a pergunta e o melhor que conseguiu foi balbuciar :-Não senhor, eu sou Cigano…

O resultado advinha-se: Uma guia de marcha para fazer a recruta num Quartel qualquer. E ali estava o Maia com o seu ar permanentemente aturdido, de quem ainda não percebeu bem o que lhe tinha acontecido. E o que lhe aconteceu foi o destino de todos os jovens na altura: A mobilização para o Ultramar. Podia, é verdade, ter desertado em qualquer altura. Sem dificuldade teria desaparecido   no seio de um grupo nómada dos seus. Mas não, ali estava o Maia pronto para o que desse e viesse.

Logo quando o vi algo me chamou a atenção  : O Maia tinha uma medonha cicatriz que ía, pela nuca, de orelha a orelha. Perante o meu espanto não se fez rogado e contou-me o que tinha acontecido: Naquele dia fatídico , andava ele na sua venda, quando entrou num prédio no qual, como em muitos outros construídos em Lisboa nos anos 40/50, o vão das escadas tinha sido mais tarde aproveitado para instalar um elevador. Um gradeamento colocado por cima do corrimão garantia a segurança possível.  Não foi porém suficiente para o Maia porque, estando ele num dos patamares, ouviu vozes femininas no andar de baixo. Movido pela curiosidade, (pensou serem umas criaditas, confessou), pendurou-se no gradeamento espreitando para  ver quem falava. Esqueceu-se que, se os elevadores sobem também descem, e esse pequeno lapso ía fazendo com que fosse quase decapitado.

Mas, Dezembro chegado, a data para o embarque aproximava-se inexoravelmente. Primeiro havia que cumprir o ultimo acto da instrução, o chamado IAO, ou “Instrução de Aperfeiçoamento Operacional”, que consistia numa semana acampados, no nosso caso nas matas do Campo Militar de Stª Margarida. O Exército, na sua infinita sabedoria, tinha decidido que a melhor maneira de nos prepararmos para os calores africanos seria sujeitar-nos ao frio glacial daquelas noites. Mas, terminada a instrução, eis-nos preparados para a partida, tendo nós ficado  aboletados nas instalações do Regimento de Cavalaria do Campo.
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Mas primeiro, com o Natal à porta, foi concedida uma licença a todo o Batalhão que seria a derradeira despedida da familia. Antes, aos soldados, foi abonado o chamado subsidio de embarque: 500 Escudos em dinheiro, uma soma considerável para a época, superior ao que maioria jamais tinha possuído.
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O dinheiro na algibeira e a miragem de ir de salto para França não tentaram ninguém e no principio de Janeiro, quando finda a licença nos apresentámos, ninguém faltou à chamada, incluindo obviamente o nosso Maia. Na madrugada do dia 12 embarcámos num comboio especial que nos levaria até à Estação de Stª Apolónia. Daí ao cais foi um instante, e num instante o Vera Cruz ter-nos-ía engolido a todos, e todos, num instante, lá fomos barra fora.

 

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                    O 4º pelotão já a bordo do Vera Cruz.O Maia ao
​                                      centro sentado no chão


 Mueda foi o nosso primeiro destino e semanas depois íriamos render uma Companhia sediada em Muidumbe, uma meia duzia de casas delapidadas a cerca de cinquenta quilometros, pela chamada estrada da morte, da sede do Batalhão. Se simbolos existem da dureza dos combates que se travaram na Guerra, Mueda é um deles. Por ironia do destino, exactamente 50 anos antes, outros soldados Portugueses combateram naquelas terras do fim do Mundo. Em 1916 o inimigo eram os Alemães. Para nós foi a guerrilha. Mas a desesperante falta de meios foi igual, como igual o que foi pedido ao imenso espirito de sacrifício do Soldado Português. 


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O Maia era um de nós, sofreu o que nós sofremos, arriscou o que nós arriscámos e nunca por um instante foi sentido de forma diferente e,  tivesse ele morrido em combate, como tantos outros, teria sido por Portugal. Na foto acima podem-se ver dois jovens que exultantes de alegria apertam as mãos celebrando o facto de estarem vivos. Tínhamos feito uma coluna a Mueda e o nosso pelotão não tinha tido baixas. E se atentarem bem na foto não poderão destinguir o Cigano do Branco, o Alferes do Soldado. A força da imagem reside em ter captado aquele momento  que nos torna profundamente humanos: A celebração da vida, toda ela igual em valor e dignidade.

Para alguns, hoje, o Maia não merece ser tratado como Português, muito embora tenha arriscado a vida por Portugal. Para esses, aqueles que só têm para oferecer é um passado de videirinhos, vai o nosso desprezo.
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E assim termina esta singela homenagem ao Maia, um bravo Soldado Português. Para que conste e seja lembrado.
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O milagre...

14/6/2018

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                            O MILAGRE DE GRENFELL TOWER

Faz hoje um ano que Grenfell Tower ardia. No meio daquele horror, com muitas dezenas de pessoas aprisionadas no interior e a serem queimadas vivas, alguém viu o impossível: Uma criança com pouco mais de um ano era atirada de uma janela do oitavo andar e era miraculosamente apanhada por alguém antes que tocasse no chão.
De repente a noticia correu célere entre os que à volta daquela visão dantesca tentavam ajudar. Os dezoito andares da torre envoltos em fumo ardiam como uma tocha. Daquele inferno caiam detritos de toda a espécie, muitos em chamas. Impossível que alguém pudesse escapar. Uma impossibilidade até aquele verdadeiro milagre acontecer: O milagre de Grenfell Tower.
As televisões acorreram pressurosas a entrevistar os que diziam ter testemunhado o impossível, talvez menos de uma dezena. Em duas horas as agências noticiosas faziam com que a noticia corresse mundo. Na manhã seguinte era a abertura dos telejornais.

E o tempo passou e as coisas ficaram assim até que há um par de meses a BBC resolveu procurar a tal criança que tinha tão extraordinariamente escapado à morte. Nos hospitais não havia registo de ter entrado. Nas listas dos moradores, fosse a dos que eram dados como desaparecidos, fosse a dos cujo paradeiro era conhecido, não constava quem correspondesse à descrição das testemunhas. Os cientistas foram chamados e foram unânimes: Um corpo com cerca de sete quilos, (o peso aproximado de uma criança daquela idade), atirado daquela altura teria alcançado ao chegar ao solo uma velocidade de mais de cem quilómetros hora e, devido à aceleração, um peso superior a cem quilos. Não existem braços humanos com força capaz de interromper tal queda.

E a BBC usando as imagens de vídeo gravadas procurou aqueles que tinham afirmado ter visto o salvamento da criança. Tornou-se rapidamente óbvio que todos diziam a verdade: Todos estavam absolutamente certos de ter visto o que diziam ter visto. Pacientemente os repórteres da BBC foram fazendo perguntas e também rapidamente se tornou claro que as testemunhas, ao de tão desesperadamente querem que pelo menos um ser humano, contra toda a probabilidade, tivesse escapado aquele inferno, desesperadamente acreditaram piamente ter testemunhado um milagre.



Quem de nós não teve um amigo, ou ente querido, doente terminal e que perante o seu fim iminente não calou a sua racionalidade e acreditou num milagre de décima-primeira hora ?

Quem no fundo não acredita que por milagre um bully, um demagogo, um mitómano, alguém completamente destituído de escrúpulos, não possa jamais voltar a ser eleito, quer seja presidente da nação mais poderosa do mundo, quer seja presidente de um clube com um passado tão distinto como o Sporting Clube de Portugal ?



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A Mentira

30/4/2018

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                                          A  MENTIRA


Tamas Dezso Ziegler é Húngaro e professor universitário. Profundo conhecedor da realidade política do seu país lança neste artigo um grito de alerta para que outras nações, outros povos, não caiam também na “mentira populista”: Oxalá seja ouvido.



“Durante a minha ultima estadia no Reino Unido encontrei-me com amigos que surpreendentemente me disseram que a campanha pró-Brexit durante o referendo tinha muitas semelhanças com as campanhas antissemiticas na Alemanha Nazi durante os anos trinta. A UE servia assim de bode-expiatório para tudo o que de mau existia no país. Este argumento causo-me uma profunda impressão.

Regressado a Budapeste apanhei um táxi no aeroporto. O carro que me transportou era topo de gama e o motorista trajava roupa cara. Mal tínhamos arrancado este começou logo por me dizer que era um acérrimo defensor da raça branca e que deveríamos preservar a pureza rácica do nosso país. Explicou-me que eram as forças externas, da China à Europa Ocidental, que nos queriam destruir misturando os Húngaros com outras raças. Para ele os “ismos”, (liberalismo, feminismo, etc.), eram forças destrutivas que vinham do Ocidente.

Este motorista, com as suas opiniões racistas, não é nada fora de vulgar. Sempre que regresso ao meu país encontro sempre outros que como ele que abertamente defendem a mesma ideologia. Mas desta vez perguntei-lhe se encontrava alguma diferença entre as suas ideias e as dos antigos fascistas, tão populares que foram na Hungria entre as duas guerras.
Pergunto-me porquê no Ensino se falha tão completamente na denuncia da ligação entre estas correntes de opinião actuais e o velho fascismo. Mesmo na Academia começou-se por suavizar os nomes que usamos: De direita ortodoxa a extrema direita, ou direita radical, até que, recentemente, se começou classificar estas posições políticas como sendo “populistas”: E esta “mentira populista”, que é resultado de uma falsa interpretação do objectivismo cientifico, espalha-se cada vez mais pela Europa.

O termo até podia ser útil pois o seu uso não implica, necessariamente, uma avaliação moral dos seus valores. Mas se se usasse o termo “demagogia de extrema direita” ou “políticas fascistas” isso seria associado a algo perigoso, extremo. Soariam as campainhas de alarme e a opinião publica seria alertada. Mas com “populismo” nada disso se passa. Historicamente o populismo definia-se como uma corrente política que tentava envolver as massas na tomada das decisões, e não afasta-las da política. Mas, se analisarmos as propostas dos mais proeminentes defensores actuais do populismo, tais como Cas Mudde (1), verificaremos o quanto artificiais e instáveis são os modelos propostos ao conterem ao mesmo tempo anti-elitismo, alto grau de emotividade, tudo misturado com nacionalismo, etnicismo e racismo, sem contudo possuírem um núcleo de valores ideológicos. O que é espantoso, por exemplo, é o facto de eminentes académicos como Jan-Werner Muller(2) referirem-se a Carl Schmitt como sendo populista. Schmitt foi um intelectual Nazi que presidiu à União dos Juristas Nacional-Socialistas, editor do jornal nazi Deutsche Juristen-Zeitung. A sua actividade cientifica, especialmente ao propor a divisão da Sociedade entre inimigos e amigos, (nós-eles), a sua posição anti-liberal, (na realidade anti-pluralista), a sua visão como deveria ser exercido o poder político, fizeram dele um profeta da ideologia Nazi, tendo sido na época considerado como o “Príncipe dos jJuristas do Terceiro Reich”. Será que agora deveremos classificá-lo também como simplesmente “populista”?



O que a Academia julga ser populismo não é mais do que simples demagogia. Quando os partidos políticos são chauvinistas, racistas, paranóicos, anti-elitistas, machistas e fazem apelo às mais básicas emoções para atacar as minorias, não podemos dizer que eles fazem parte do jogo democrático.


No meu país esse tipo de partidos políticos destruíram a democracia, criaram uma autocracia eleitoral, uma semi-ditadura, em que foram abolidos os limites no exercício do poder e impedida a realização de eleições livres. Fidesz, o partido do Governo, usa as técnicas do regime comunista para manipular a opinião pública, que este por sua vez foi buscar aos nazis. Muitos são os partidos que usam esta mascara democrática quando são, no seu âmago, profundamente anti-democráticos. Não acreditam na Democracia, nem nos valores básicos do pluralismo que são o seu sustento, nem muito menos nos Direitos Humanos. Na sua génese vamos encontrar a mesma rejeição dos valores civilizacionais do Iluminismo, rejeição essa que foi parte integrante da ideologia fascista. Vale a pena procurar ver no YouTube os antigos discursos de Mussolini e Hitler para se poder constatar em como actuais os discursos do Primeiro-Ministro Viktor Orbán são em tudo parecidos. Nigel Copsey(3), que escreveu talvez o melhor artigo sobre o assunto, disse:


“O populismo de extrema direita, (se quisermos continuar a usar o termo), ganhou sofisticação largamente devido ao trabalho dos teóricos do neo-fascismo, particularmente no que toca à adopção de um discurso etno-pluralista”


Na Alemanha, só no ano passado, a extrema-direita foi responsável por mais de 23.000 crimes, tendo sido atacados 900 centros de acolhimento para refugiados, com 1.313 casos de violência física resultando em ferimentos graves e 18 tentativas de assassinato. Os “populistas” do AfD(4) são os responsáveis pela criação do ambiente de ódio que levou a este resultado. Como Paul Krugman(5) escreveu:



“Não sabemos como iremos acabar, mas o processo de destruir a substancia da Democracia enquanto se preserva a sua forma, está em plena marcha”.




(1) – Cas Mudde – Académico Holandês, (U. Leiden-PhD Ciencia Política), é actualmente Professor na Universidade da Geórgia. Autor, entre outros livros, de Populist Radical Parties in Europe.
(2) – Jan-Werner Muller- Académico Alemão professor universitário (U. Oxford/U. Princeton)
(3) – Nigel Copsey – Professor de História Moderna, (U. Teesside), especialista no estudo do fascismo Europeu.
(4) – Paul Krugman – Americano, Prémio Nobel em Economia- (2008)
(5) – AfD – Alternative fur Deutschland - “Alternativa para a Alemanha” - Partido de extrema direita alemão.



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Onde está...

27/4/2018

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                         ONDE ESTÁ JEREMY CORBYN ?

Pois no meio da multidão, ontem no estádio do Arsenal durante o jogo com o Atlético de Madrid.

De seu título completo: Leader of her Majesty's Official Opposition, Rt Hon Jeremy Corbyn MP

Outras terras...



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Tudo tem...

22/4/2018

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                              TUDO TEM UMA EXPLICAÇÃO



Depois do ataque de 4 de Março os media estiveram cheios de previsões sombrias sobre o que o futuro reservaria a Sergei Skripal e à filha. O agente tóxico que os vitimou, o novichok, era, segundo inúmeros especialistas que quiseram compartilhar com o publico o seu altíssimo saber, de tal maneira letal que o melhor que lhes poderia acontecer seria manterem-se em estado vegetativo até ao fim dos seus dias. Mas as semanas foram passando até que, para surpresa geral, a jovem Yulia teve alta do hospital e, pelo pouco que se sabe, em breve será a vez do pai, Sergei.


Diz-se agora o agente tóxico foi besuntado na maçaneta da porta da casa de Sergei Skripal, tendo sido por essa via que pai e filha foram contaminados. Mas essa explicação levanta mais duvidas do que as que desfaz: Se os Skripal estavam de tal maneira contaminados ao ponto de terem eles próprios contaminado todos os locais por onde passaram no centro de Salisbury, então o interior da sua casa não teria escapado. Acontece que o pai tinha hamsters e um gato como animais domésticos. Os primeiros foram encontrados mortos de sede quando finalmente a policia entrou na residência, e o gato estava num estado tão deplorável que teve de ser abatido, mas nenhum deles apresentavam sinais de terem sido vitimas de novichok.


Situação portanto no mínimo embaraçosa para a narrativa oficial, quando ainda por cima os especialistas do OPCW garantiam que a substancia tóxica que analisaram, a que alegadamente vitimou os Skripal, tinha um alto grau de pureza.
Explicações precisavam-se, e foi assim que um um especialista altamente qualificado, Dan Kaszeta, com 27 anos de experiência no campo da guerra química, tendo trabalhado com o Exército Americano, com a Casa Branca e, last but not least, com os Serviços Secretos Americanos, publicou um artigo destinado a “desmistificar” falsas ideias que corriam na opinião publica. Como os leitores da Gazeta não são menos que os outros aqui se transcreve parte do referido artigo, uma “magistral lição” para a ilustração de todos:


“ Uma questão interessante foi levantada. Se os 'nerve agents'(1)- e em particular o chamado novichok - são tão mortais porque razão Sergei e Yulia Skripal não morreram imediatamente? Em vez disso acontecer, como inúmeras teorias da conspiração que correm na Net apontam, ambos, pai e filha, estão fora de perigo. Esta é uma interrogação válida que merece resposta.


“Em primeiro lugar é importante usar a terminologia correcta: 'nerve agents' são substancias químicas que interferem com o sistema nervoso ao ligarem-se a uma enzima chamada acetilcolinesterase. Segundo esta definição um numero de armas químicas e um numero de pesticidas incluem-se entre aquilo que se chama 'nerve agents'.


'Nerve agents' não são toxinas por definição técnica. As toxinas têm uma fonte animal, vegetal ou microbiana. O veneno das cobras é uma toxina. 'sarin' e o 'vx', assim como o 'novichok', ao terem origem em laboratórios, não são toxinas. O termo 'nerve gas' também não é correcto uma vez que os 'nerve agents' se apresentam em estado sólido ou liquido, quando à temperatura ambiente.
…

Os 'nerve agents' só actuam rapidamente se inalados. A contaminação na caso dos Skripal parece ter sido por via da epiderme o que retarda a sua acção. Os sintomas levam horas a progredir dos locais onde se deu a exposição até ao sistema nervoso central. Numa experiência feita no período da Guerra Fria, cabras que tinham sido tosquiadas foram expostas ao 'nerve agent' “soman” e a morte só ocorreu passadas 48 horas. Não é propriamente rápido.
Em segundo lugar, se aconteceu alguma coisa que reduziu a dose pretendida – por exemplo se a pessoa que abriu a porta usava luvas - então existe a possibilidade real da dose letal ter sido mitigada.


Depois vem o factor humano. E se um dos Skripal disse:”Mas o que é esta coisa peganhenta que tenho nas mãos? Vou lavá-las” Isto seria uma maneira de fazer imediatamente descontaminação. Água e sabão são um meio eficaz de neutralizar os 'nerve agents' como inúmeros estudos provam. Estes se forem do tipo dos organofosfatos degradam-se rapidamente na presença de água devido a um mecanismo chamado hidrólise. E se a maçaneta da porta tenha ficado molhada? Salisbury não é conhecida por ter um clima árido.
…
A conclusão é que os 'nerve agents' só matam se não existir tratamento médico e os registos mostram nesse caso que o seu nivel de mortalidade é realmente baixo. Conhecem-se inúmeros casos de pessoas que sobreviveram depois de serem expostas a doses elevadas de 'nerve agents'….”


As investigações prosseguem e Salisbury continua em pé de guerra. Há poucos dias foi noticiada a existência de locais no centro da cidade a que as autoridades chamaram “pontos quentes” que estariam ainda altamente contaminados e que continuam interditas à população. Isto apesar de terem passado oito semanas em que choveu copiosamente. Aqui a “hidrólise” não funcionou.
Os serviços de informação revelaram também que as conta bancárias de Yulia Skripal eram há cinco anos devassadas pela policia secreta Russa. Nada que o Google não faça há muito mais tempo e infelizmente não só à jovem Yulia.
Ficamos também a saber que os mesmos serviços secretos Russos treinavam também há já vários anos os seus agentes como besuntar as maçanetas das portas com novichok, noticia que me deixa agora indeciso entre se rir ou se chorar.

(1) Nerve agent- No original




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A Armadilha

12/4/2018

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                               A ARMADILHA DE TUCÍDIDES



Tucídides, General ateniense e o primeiro Historiador no sentido moderno do termo, foi o autor há cerca de 2.400 anos da “História da Guerra do Peloponeso” onde descreve os vários conflitos que opuseram Atenas a Esparta. Tucídides descreve em como a ascensão de Atenas causou alarme em Esparta, a potencia dominante da altura, fazendo com que esta se preparasse para a guerra. No final Esparta ganharia o conflito, mas a um custo tal que ficou irremediavelmente fragilizada. Trinta anos depois nem Esparta nem Atenas seriam as maiores potencias do Peloponeso.
Nisto consiste essencialmente a “Armadilha de Tucídides”. O medo causado na potencia dominante pela ascensão de uma nova potencia, medo que levará à guerra como única solução para regressar ao status quo. A História ensina que estas rivalidades acabam quase sempre mal: Nos últimos quinhentos anos por dezasseis vezes um poder emergente desafiou a potencia dominante, e em doze o resultado foi a guerra.

Infelizmente todos os sinais apontam para que a rivalidade entre China mais a Rússia, por um lado, e os Estados Unidos, por outro, estão a causar um stress estrutural tão severo no equilíbrio de forças mundial que, com grande probabilidade, as coisas vão acabar mal.
Não que não haja a consciência do perigo que se corre: Tucídides continua a ser lembrado e estudado. O Presidente do Naval War College, instituição da Marinha dos Estados Unidos que dá preparação aos oficiais superiores, o Almirante Stansfield Turner, faz com que cada aluno receba no começo do curso um exemplar da “História da Guerra do Peloponeso”, e se o faz é porque obviamente considera que a obra tem ainda, passados que são 2.500 anos, muito que ensinar. Como por exemplo: Porque descortinável razão, e a que custos, os Atenienses mandaram um exército para a Sicília, tão remota e desviada estava essa ilha do teatro das operações e dos interesses de Atenas ?

Atenas não queria a guerra com Esparta. O Kaiser não queria a guerra em 1914. Mao não queria a guerra da Coreia. Mas uma vez que as máquinas militares são postas em marcha, equívocos, erros de cálculo e animosidades mutuas podem levar a um conflito de proporções que ninguém tencionava.

E como não lembrar o que Carl von Clausewitz chamou “o nevoeiro da guerra”?“Como a gasolina está para o fósforo, acelerantes podem tornar um conflito acidental e localizado, ou uma provocação feita por terceiros, numa guerra generalizada”. Disse ainda: “ A guerra é o reino da incerteza. Três quartos dos factores em que a acção militar se baseia estão envolvidos num nevoeiro de incerteza”. Esta profunda incerteza pode facilmente levar a que quem tem o poder decisório aja agressivamente, quando os todos factos aconselhariam prudência.



Vivemos num mundo em regressão. No auge da Guerra Fria, com a União Soviética, assinavam-se tratados de limitação das armas nucleares que incluíam mecanismos de verificação mutua. Hoje, Trump anuncia um plano de desenvolvimento maciço de armas nucleares. Nos termos do ultimo tratado desse tipo, o SALT III, (que formalmente não foi ratificado, mas cujos protocolos são respeitados), aos Estados Unidos e à União Soviética era permitido terem, se a memória não me falha, exactamente 1652 ogivas nucleares activas, isto é montadas em meios capazes de atingir o inimigo. Fora os muitos milhares em “armazém”. Isto significa que nem Rússia nem Estados Unidos podem ter a certeza de aniquilar completamente o outro com um ataque de surpresa. Mas o maior paradoxo é que enquanto que nenhuma da nações pode ganhar uma guerra nuclear ambas têm de demonstrar vontade de arriscar entrar numa, pois aquela que responsavelmente declarasse jamais dar esse passo daria à outra uma inestimável vantagem, obrigada que estaria a recuar sempre em nome dos seus princípios.


Existiam até agora o que John F. Kennedy chamava as “precárias regras do status quo”, um conjunto de normas que eram tacitamente respeitadas por ambos os lados. Era sabido que a sobrevivência do planeta requeria cautelas, vias de comunicação abertas, limites, compromissos e cooperação.



Mas as regras laboriosamente postas em prática durante os cinquenta anos de guerra fria desapareceram, e hoje vivemos todos dançando à beira da sepultura. No Reino Unido a Primeira Ministra anunciou que participará num ataque à Síria sem consultar o Parlamento. O Brexit tinha como principal objectivo devolver a soberania a esse mesmo Parlamento, dizia ela. Nunca um Primeiro Ministro Britânico ousou tomar semelhante acção. Mesmo nesta “Velha Democracia” a primeira vitima é a liberdade de por em causa a versão oficial dos acontecimentos, com os media alinhados com o Governo, e a própria BBC não passando do “alegadamente” quando se refere ao ataque com armas químicas em Eastern Ghouta, “alegadamente” cometido por tropas leais a Assad. Longe vão os tempos em que assistir aos programas da BBC era “ ver pessoas com que se discorda, dizendo coisas que não gostamos”.


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Os Planos...

8/4/2018

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                                OS PLANOS DO PENTÁGONO

                         (COMO IMPEDIR O RESURGIMENTO DE UM NOVO RIVAL)


A 7 de Março de 1992 o New York Times publicou excertos dos planos de defesa do Pentágono para o quinquénio 1994-99 que lhe tinham sido fornecidos por fonte anónima. Esses planos ficaram conhecidos como a Doutrina Wolfowitz, de Paul Wolfowitz, então Sub-Secretário da Defesa. A sua publicação levantou uma enorme celeuma, considerando-se que esses planos delineavam uma estratégia imperialista onde se defendia o unilateralismo e acções militares preventivas de modo a impedir o surgimento de potenciais ameaças e a elevação de qualquer outra nação ao estatuto de grande potencia.

A controvérsia foi de tal ordem que a versão oficial dos planos, que só foi publicada em 16 de Abril de 1992, sob a supervisão do Secretário da Defesa Dick Cheney, acabou por ser largamente expurgada das suas propostas mais polémicas, que acabaram no entanto por ser incorporadas mais tarde na chamada Doutrina Bush. Dela disse o Senador Edward Kennedy: “ Ela é, ( a Doutrina Bush), um mapa para o imperialismo Americano no Séc.XXI, que nenhuma outra nação pode, ou deve, aceitar”.
Olhando para a situação vivida em 2018 não parece possível concluir que a Doutrina Wolfowitz, bem como a Doutrina Bush, não estejam hoje a ser plenamente aplicadas.

Objectivos estratégicos

1 - O estatuto de super potencia

“ O nosso primeiro objectivo é prevenir o ressurgimento de um novo rival, quer seja no território da antiga União Soviética, quer noutra localização. Este é o principio básico que rege a nossa estratégia de defesa regional e que requer da nossa parte a determinação de impedir que uma potencia hostil possa dominar uma região cujos recursos, se estiverem sob um controle consolidado, possam gerar uma potencia de ordem global.
…
“São três os aspectos adicionais para se atingir este objectivo. Primeiro, os Estados Unidos devem demonstrar suficientes capacidades de liderança para criar e manter uma nova ordem suficientemente poderosa que possa convencer os potenciais concorrentes que não devem aspirar a ter um papel mais importante, nem prosseguirem acções agressivas na defesa dos seus legítimos interesses.”

2 – A ameaça Russa

“...Temos de admitir que as forças convencionais dos Estados que faziam parte da antiga União Soviética ainda possuem globalmente a maior força militar da Euroásia; e não menosprezamos os riscos para a estabilidade da Europa de uma possível reacção nacionalista na Rússia, com tentativas de reincorporar os recém independentes Estados da Ucrânia, Bielorrússia, e provavelmente outros. Devemos ter presente que as mudanças democráticas na Rússia não são irreversíveis e que, apesar das dificuldades que esta presentemente atravessa, continua a ser maior potencia militar na Euroásia e a única que tem capacidade para destruir os Estados Unidos...”

“...no futuro imediato a principal preocupação para os EUA é a capacidade da Rússia, e de outras republicas, para levar a cabo a desmilitarização, convertendo as suas industrias militares para a produção de bens civis, procedendo também à eliminação ou, no caso da Rússia, à redução drástica do seu arsenal nuclear...”
….
“...A Nato continuará a assegurar a indispensável base para garantir uma segurança estável na Europa. È portanto fundamental preservar a Nato como o principal instrumento que garanta essa defesa e estabilidade, bem como o meio que permite aos Estados Unidos ter influencia e participação nas questões da segurança Europeia...”
….
“… ao mesmo tempo que os Estados Unidos apoiam a integração Europeia, deveremos impedir a emergência de uma força de defesa apenas Europeia, que poderia diminuir o papel da Nato ao reduzir a importância do comando unificado da Aliança no teatro de operações do Centro-Leste Europeu.”

“...A melhor maneira de trazer para o lado do Ocidente os Europeus do Centro-Leste, estabilizando as suas instituições democráticas, é fazê-los participar nas organizações políticas e económicas. Na primeira oportunidade deve-se admitir esses países na UE e expandir a Nato para Leste...”

“… Os EUA deveriam considerar dar também aos Estados do centro-leste da Europa as mesmas garantias de defesa que actualmente gozam os Estados do Golfo Pérsico...”

3 – Irão e Síria

“… no Médio Oriente o nosso objectivo global é manter-mos-nos como a potencia predominante na região e preservar o acesso ao petróleo...”

“...como ficou demonstrado continua fundamentalmente importante impedir o surgimento de uma força hegemónica, ou uma aliança de forças, que possa dominar a região. Esta questão é particularmente importante no que toca à península Arábica...”

Uma Palavra final:

Noticia-se hoje que as forças Sírias leais a Assad utilizaram mais uma vez gases contra as populações civis. Desta vez, como das outras, foram utilizados, não produtos tóxicos sofisticados, mas gases à base de cloro que tiveram a sua “estreia” há um século atrás nas trincheiras da Flandres.
Este ataque foi feito abertamente e ao alcance dos media ocidentais: As televisões passam constantemente imagens excruciantes de crianças, (sempre só crianças), a sofrer terrivelmente devido aos efeitos desses gases.
Mas os ganhos militares, a terem havido, são negligenciáveis. Travam-se os últimos combates e o fim da guerra está à vista com a vitória do Governo Sírio.
Mas os custos políticos para o regime de Assad são imensos, como imensa é a condenação da Rússia pelo apoio que lhe dá.
Cria-se assim um imperativo moral para que os Estados Unidos tomem a iniciativa de atacar as bases militares Russas na Síria o que, conseguida a diabolização da Rússia, (Salsbury incluída), foi sempre o objectivo final.
E se duvidas houvesse compare-se com as reacções pelo assassinato pelo exército Israelita de dezenas de manifestantes civis desarmados, (incluindo mulheres e crianças), na Faixa de Gaza.
Que Governos condenaram ? O Britânico não.



"A Armadilha de Tucídades" será o assunto do próximo post


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Damage Control

4/4/2018

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                                    CONTROLAR OS DANOS


Controlar os danos é a palavra de ordem do Governo Britânico depois de Gary Aitkenhead, que é chefe do centro para a investigação das armas químicas de Porton Down, nos arredores de Salisbury, ter vindo ontem a publico declarar não ser possível identificar a origem do agente tóxico que vitimou os Skripal a 4 de Março passado.

Mas o que tem sido abundantemente recordado pelos media são as declarações de Boris Johnson feitas ao canal de televisão Alemã Deutsche Welle a 20 de Março, em que afirma que lhe foi pessoalmente garantido por esse responsável máximo dos laboratórios de Porton Down que o agente tóxico era originário da Rússia. “ Eu próprio perguntei pessoalmente ao tipo 'tem a certeza?' e ele respondeu que não tinha a mínima duvida “.


http://www.dw.com/en/boris-johnson-russias-position-in-skripal-case-is-increasingly-bizarre/a-43043873


Logo é impossível não concluir que Ministro dos Negócios Estrangeiros foi no mínimo liberal no respeito pela verdade quando disse o que disse.
A linha de defesa do Governo é agora afirmar que possui “outras provas”, além da origem do novitchok ter sido a Rússia,  que dão a certeza ter sido Putin o autor do crime. Infelizmente para nós não podem ser reveladas sem comprometer a “fonte” das informações, que devem permanecer confidenciais. Acaba assim por ser uma questão de fé acreditar ou não no que diz Theresa May.

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Lord Sugar

31/3/2018

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                    A  GAZETA  DO  MIDDLESEX

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                                              INFAMIA

O hoje multi-milionário Lord Sugar, individuo que teve porém um berço bem modesto, tornou-se famoso por ser a figura principal do programa de televisão “The Apprentice”, o mesmo que na sua versão Americana deu notoriedade a Trump. Militante do Partido Trabalhista demitiu-se, já imensamente rico, em 2015 quando Jeremy Corbyn foi eleito líder por, segundo disse, este não ser suficientemente amigo “dos negócios”.

Desde aí não há insulto, não há calunia que não bolse sobre Jeremy. Quando se pensava que não poderia descer mais baixo eis que publicou ontem no Twitter esta foto-montagem.
Pergunta-se: Quem é o fascista aqui ?

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Perguntas

27/3/2018

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                     A  GAZETA  DO  MIDDLESEX

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                                           PERGUNTAS


“Quando a Rússia invadiu a Ucrânia e ocupou a Crimeia em 2014 foi altamente criticada pelos media Americanos, assim como quando interveio na Síria no ano seguinte. Agora imaginem o que não se diria do país de Putin se, quase 17 anos depois de declarada a “Guerra Global ao Terrorismo”, as tropas Russas, as suas forças de operações especiais, a sua aviação e drones, estivessem ainda envolvidas em operações militares em pelo menos 8 países do Médio Oriente e de África: Afeganistão, Iraque, Líbia, Níger, Paquistão, Somália, Síria, Yemen e, já agora, se quiserem juntar à lista, as Filipinas.


“Imaginem as indignadas primeiras páginas e as aberturas dos telejornais que teríamos se a Rússia, década e meia depois de ter iniciado essa guerra global sem fim, continuasse com a destruição, o caos, os mortos e os refugiados que ela causava. Imaginem a enorme indignação, e como a Rússia, uma das grandes potencias mundiais, seria classificada pela comunidade internacional por estar envolvida nesse conflito sem solução. Em Washington os protestos seriam de uma violência nunca vista, a linguagem usada de uma dureza inédita, e as criticas ferozes e sem descanso...”


Tom Engelhardt - in     www.Tomdispatch.com



Tom é um Americano autor do blog Tomdispatch e Fellow do Nation Institute e Teaching Fellow na Graduate School of Journalism da University of California-S.F. (Berkeley)
Segundo Tom, o blog Tomdispatch pretende ser um antídoto eficaz para a informação veiculada pelos media de grande circulação, e por essa razão tornou-se de leitura obrigatória.


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