A GAZETA DO MIDDLESEX
V
O segundo maior factor contributivo para o aumento do anti-intelectualismo nos últimos quarenta anos foi o fundamentalismo religioso. Os media modernos com o seu apelo, disfarçado ou não, à emoção e não à razão, desempenharam um papel importante na difusão de uma forma de fé adversária dos mais importantes ideais racionalistas que deram forma à civilização ocidental desde o Iluminismo. O triunfo do fundamentalismo Cristão, maioritariamente, mas não totalmente, Protestante, baseia-se na convicção que cada palavra na Bíblia é literalmente verdadeira, tendo sido revelada pelo próprio Deus. Inquéritos de opinião levados a cabo nos últimos quarenta anos demonstram consistentemente que mais de um terço dos Americanos acreditam nessa interpretação literal da Bíblia, com seis em cada dez acreditando que as terríveis profecias do Livro do Apocalipse- que envolvem o massacre de todos que não aceitem Jesus como sendo o Messias- um dia se tornarão realidade.
Começando com o radio-evangelista dos anos vinte Billy Sunday, os fundamentalistas Americanos com a sua visão a preto-e-branco de cada assunto souberam usar com eficiência todos os novos meios de comunicação. A religião liberal, com os seus tons de cinzento, determinada como estava em dar lugar ao saber secular na casa da Fé, não se prestou tão facilmente a esse papel, ficando em ainda maior desvantagem com os media visuais do que já estava na radio. Desde o vociferante Pat Robertson no 700 Club, ao filme de Mel Gibson A Paixão de Cristo, a mensagem religiosa é mais poderosa em vídeo quando não é moderada pelo pensamento secular e não faz apelo senão às emoções, não dando lugar a qualquer dúvida. Esse filme Gibson tem as sua raízes no fundamentalismo católico que foi há muito rejeitado pelo Vaticano, indo buscar ao Evangelho de Mateus a acusação de terem sido os Judeus os responsáveis pela crucificação de Jesus. A enormes audiências desse filme, imensamente popular nos Estados Unidos, vieram, não das fileiras dos católicos cuja Fé não repousa no literalismo da Bíblia, mas sim nas dos Protestantes de direita.
Mesmo quando os media não promovem uma particular versão da religião exploram a credulidade Americana no que respeita ao sobre-natural. Nestes últimos anos a televisão produziu incontáveis programas destinados ao vasto mercado daqueles que acreditam em fantasmas, anjos e demónios. Mais de metade dos Americanos crê em fantasmas, um terço na astrologia, três quartos em anjos, e quatro quintos em milagres.
O marketing na América do Apocalipse tornou-se numa grande industria que tira partido do fundamentalismo e da superstição mais paranoide. As maiores denominações religiosas há muito que não dão ênfase ao Livro do Apocalipse escrito que foi pelo menos sessenta anos após a morte do Jesus histórico, não tendo senão os mais ténues laços com os Evangelhos. Que importa o que os maiores teólogos dizem desde o SEC XIX sobre a Bíblia e sobre a relação dos seus textos com a verdade histórica, se as fantasias apocalípticas dos Americanos resistem a qualquer apelo de racionalidade ?