A Gazeta do Middlesex

A Era da Não-Racionalidade Americana

31/1/2017

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                  A ERA DA NÃO-RACIONALIDADE AMERICANA
        
                  A Estupidificação e o Futuro da Democracia


“Se uma nação julga que é possível ser ao mesmo tempo livre e ignorante- vivendo num estado de civilização- espera o que nunca existiu, nem existirá.”

                                                                                                               Thomas Jefferson


O pasmo, a perplexidade, quando nos vem ao pensamento que Donald Trump é mesmo o Presidente dos Estados Unidos, creio que nos invade a todos. Afinal é a América que tem de longe o maior numero de laureados com o prémio Nobel e as melhores e mais prestigiadas universidades do planeta. E a pergunta volta : Como foi possível ? O que correu tão mal na sociedade Americana que um reles e ignorante demagogo, um bully, foi capaz de enganar, intimidar e finalmente vencer todas as forças da civilização da outrora orgulhosa nação Americana, e tudo isto debaixo dos nossos impotentes narizes ?

Percebe-se facilmente que as causas não são de hoje, muito embora algumas, e das mais fortes, têm a ver com a actualidade, vindo em primeiro lugar a globalização com a consequente destruição do tecido produtivo,.
Mas uma outra nação, também outrora orgulhosa do seu passado e História, vê a sua Chefe de Governo arrojar-se aos pés do indigno personagem, num acto que colectivamente envergonhou e humilhou o seu povo, tornando publica a sua rejeição, a sua e a dos seus seguidores, do papel que era até então o do seu país, como primus inter pares no concerto das nações europeias irmãs, oferecendo apenas com esta desprezível demonstração de vassalagem, o vir-se a tornar numa colónia da sua antiga colónia,
Este 2016 que agora terminou será lembrado certamente como um tempo de destruição e ruína dos valores que tínhamos como seguros, e alguma coisa poderá ser salva se formos capazes de pensar com inteligência e clareza, livres de ter de condescender com as formas de pensamento não-racionais que nos rodeiam.

E alguns sinais da gravidade do momento surgem onde menos se esperava : Os lugares vagos para novos alunos nas Faculdades de Filosofia da Grã-Bretanha estão todos preenchidos, e o mesmo acontece em Portugal. Neste tempo de destruição e ruína, os jovens procuram respostas e procuram-nas ansiosamente, sendo óbvio que as não encontram nas business schools.
O 1984 de George Orwell tem uma procura inusitada em ambos os lados do Atlântico, tendo-se esgotado rapidamente os exemplares disponíveis. Novamente a procura desesperada por uma espécie de guia em como viver nos tempos de Big Brother que se avizinham.
Donald Trump é, como espero poder demonstrar, o culminar de um longo processo de imbecilização da sociedade Americana, aliás idêntico ao que ocorre em Portugal. Neste país as televisões há muito que não cumprem o dever moral de elevarem culturalmente o povo que deviam servir. Doses maciças de telenovelas em todos os canais servem um publico acrítico. Os seus repetidos clichés, com explicações simplistas para problemas complexos, desobrigaram as audiências do problema de terem de pensar, e o maniqueísmo das suas personagens sendo todas, ou absolutamente boas ou absolutamente más, exonera quem vê da maçada de ter de fazer julgamentos morais.

E nesta tarefa nada é melhor do que começar com o livro de Susan Jacoby, (USA, 1945 - ), que felizmente fui encontrar nas minhas estantes e cuja capa com a ajuda do scanner, (é a edição Inglesa), serve de frontispício para este post.



A Era da Não-Racionalidade Americana, (A estupidificação e o futuro da Democracia) foi escrito em 2008, muito pouco tempo antes do crash de Wall Street. Não foi porem o primeiro a tratar do problema: Já em 1963, 45 anos antes de Jacoby, Richard Hofstadter publicava o seu Anti-Intelectualismo na América, um tempo de ainda relativo optimismo, conforme se pode ler no seguinte trecho:

“Uma das maiores virtudes da Sociedade liberal do passado foi o ter conseguido que coexistissem tantos estilos de vida intelectual – Podemos encontrar os que são apaixonados e rebeldes, outros elegantes e sumptuosos, ou contidos e ásperos, espertos e complexos, pacientes e sábios, alguns capazes de observar e persistir. O que importa é a abertura de espírito e a generosidade tão necessárias para se compreender que variedades da excelência podem ser encontradas mesmo nas sociedades mais paroquiais… É possível obviamente que esses caminhos de livre escolha venham a ser fechados e que a cultura do futuro seja dominada pela estreiteza de pensamento. É possível ; Mas enquanto formos capazes de por o peso da nossa vontade no prato da balança da História, viveremos acreditando que assim nunca acontecerá.”

Hoje sabemos que infelizmente o optimismo de Hofstadter era infundado, e que décadas depois a cultura na América tornou-se numa ignorante e anti-racional cultura popular alimentada por imagens digitais, e donde o pensamento racional foi totalmente expulso.

Mas voltando ao livro de Susan Jacoby, dele escreveu Richard Dawkins :

“Susan Jacoby analisa com rigor a estupidificação da cultura Americana, o crescente desprezo pela razão e realidade, e as suas insidiosas consequências políticas. Existe uma tentação para nós Britânicos de nos deixarmos levar numa complacente Schadenfreude. Seria um terrível erro, não apenas pela razão convencional que os ventos da moda vindos do outro lado do Atlântico sopram inexoravelmente para o nosso lado. Nós temos cá os nossos próprios Hooligans anti-intelectuais, os nossos negadores da realidade, e todos aqueles que a eles se rebaixam. Todo o mundo de língua Inglesa tem de recuperar o verdadeiro elitismo, aquele que não é exclusivo dos snobs, mas que trabalha arduamente para elevar o nível geral e fazer crescer a elite culta...”

E o New York Times escreve:

“Poucos assuntos têm maior actualidade do que aqueles que Susan Jacoby trata no seu livro: A América está presentemente doente com uma mutação que interliga ignorância, anti-intelectualismo e anti-racionalismo...”

O Chicago Tribune por seu lado publica:

“Susan Jacoby pertence ao numero dos críticos culturais que com eloquência se recusam a engolir a noção que a literacia visual- filmes e TV- é intelectualmente equivalente à leitura de uma obra clássica. Jacoby mostra em como os valores do Iluminismo- racionalidade, devoção ao método cientifico, e tolerância pela liberdade de pensamento- se transformaram nesta triste charada actual...”

Portanto os próximos posts da Gazeta serão sobre o livro de Jacoby, com a publicação de vários de seus excertos. A escolha deles será obviamente minha, como minha é a responsabilidade de dar a conhecer o essencial da obra, uma vez que a tradução integral do livro, com as suas trezentas páginas, é uma tarefa para a qual sinto não ter já forças.

Seguir-se-ão outros autores que trataram o mesmo tema. Indubitavelmente, na minha opinião, o de maior relevância da actualidade.
Portanto, Watch this Space !



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O que Pareto diria hoje

26/1/2017

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                              O QUE PARETO DIRIA HOJE?

Em 1848 nascia em Paris Fritz Wilfried Pareto, filho de pai aristocrata Italiano que se tinha exilado em França fugindo à repressão que se seguiu ao golpe falhado de 1833 liderado por Giuseppe Mazzini, o herói do movimento para a unificação de Itália, e de mãe de nacionalidade Francesa. O nome alemão traduzia a admiração do pai pela revolução que entretanto tinha eclodido na Alemanha e que lutava também pela unificação desse país. Regressada a família finalmente a Itália em 1858, o jovem Fritz viu o seu nome latinizado para Vilfredo Federico, e foi com ele se tornou universalmente conhecido.
Engenheiro, Sociólogo, Filosofo, Economista e especialista em Ciência Política, Pareto cedo se interessou pelo problema do poder e da riqueza. Como é que se adquirem e como se distribuem ?

Se é verdade que a diferença entre ricos e pobres sempre existiu, ele foi o primeiro a fazer um esforço sério para a medir. Inspirado pela sua descoberta que em Itália 80% das propriedades agrícolas pertenciam a 20% dos agricultores, consultou os registos dos impostos da Alemanha e da Suíça, desde o Séc. XV e XVI até à actualidade, e os da Grã-Bretanha, Prússia, Saxónia, Irlanda e Itália, encontrando sempre a mesma proporção 80%-20% na distribuição da riqueza. Curiosamente descobriu também que no seu quintal 20% das vagens de ervilhas produziam 80% do total !
Nasceu assim o Principio de Pareto, também conhecido como a regra 80/20.
Mas Pareto foi também o responsável pelo termo, hoje de uso banal, elites, como designando a minoria que detém o poder. Mas Pareto usava o termo em sentido lato, defendendo que em toda a actividade humana existe uma elite, seja ela a de advogados, políticos ou trabalhadores manuais, e que mesmo existirá uma elite de ladrões.

Claro que a elite que detém o poder económico e político era a que mais o interessava, defendendo que existirá sempre uma elite que governa, que existirá sempre o domínio de uma minoria sobre a maioria mas que, crucialmente, a História nada mais é do que a crónica de uma elite sendo substituída por outra, no que Pareto chamava “a circulação de elites”. Quando a elite existente entra em declínio, ela é substituída por outra, ou por assimilação ou por revolução, mas resultando sempre na eliminação da velha elite.
Pareto classificou as elites governantes em dois tipos distintos: As raposas, que são aquelas que governam usando o engano, a esperteza e a manipulação e cujo mando é caracterizado pela descentralização, pluralismo, cepticismo e que resiste a empregar o uso da força, e a dos leões, que pelo contrário promovem a unidade e a homogeneidade racial e religiosa e não hesitam em usar a força para impor os seus princípios.

Não é preciso um grande esforço de imaginação para encontrarmos quais serão as raposas do dia de hoje, como sendo aquelas que defendem a globalização e o liberalismo como meio de criar um Mundo interconectado e tolerante, e na sua recusa em aceitar o neo liberalismo e o lucro como fim ultimo da actividade humana.

Pelo contrário os leões, são a reacção e o fechamento da sociedade sobre si própria, o aumento da xenofobia, intolerância, racismo e conservadorismo.
Para Pareto, leões e raposas, são dois tipos distintos de governar e a grande questão é saber-se qual, em dada altura, domina a outra.
Nos anos 20 Pareto, cada vez meis desiludido com a situação em Itália e com o modo em como era governada, criou o termo plutocracia demagógica para caracterizar um período em que os ricos governavam por detrás de uma fachada democrática, estando mais interessados em sugar a riqueza nacional em proveito próprio do que na sua criação.

Seria interessante conhecer o que diria hoje ao saber que a sua regra 80/20 se transformou naquilo que se chama o “ um por cento”: Uma concentração da riqueza inimaginável um século atrás, com “um por cento” da população Americana detendo 99% da riqueza.
Recentemente foi publicado que 6 indivíduos são donos de tanto como o que metade da população mundial possui. Vem à memória o velho slogan “O que é bom para a General Motors é bom para a América”: Com um plutocrata como Presidente dos Estados Unidos, que chamou ao seu governo outros plutocratas como ele, e que afirma claramente que tenciona governar o país como se de uma grande corporação se tratasse, não é difícil imaginar o futuro que nos espera, uma vez que não se vê como, desta vez, que a actual elite governante, tal o seu poder, possa um dia ser substituída por outra.

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Irmãos Unidos

20/1/2017

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                                         IRMÃOS UNIDOS


Neste momento em que Donald Trump toma posse como Presidente dos Estados Unidos não é possível explicar o que nos levou até aqui sem falar nos irmãos Koch. Quem são, o que fizeram, o que fazem e como, e quais são os seus planos.
Encontrarão a resposta neste filme de cerca de uma hora que irá mudar o entendimento do espectador sobre a realidade actual. Falado em Inglês tem porém a facilidade de se poderem activar as legendas que, muito embora estejam na mesma língua, tornarão mais fácil o entendimento.


https://www.youtube.com/watch?v=2N8y2SVerW8



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Vale Tudo

19/1/2017

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                                         VALE  TUDO


No fim de semana passado, o valor da libra em relação ao dólar caiu para valores mínimos de há trinta anos. Mas basta atentar no gráfico acima para se ver que na Terça-feira, dia 17, exactamente ao mesmo tempo que a Primeira-Ministra discursava dando a conhecer pela primeira vez que o Brexit seria um corte radical com a UE, o valor da moeda Britânica subia miraculosamente como um foguete.
Jim Armitage, o Editor para os assuntos da City do London Evening Standard, um vespertino da capital com uma tiragem de 800.000 exemplares, foi capaz de prever na  edição do dia 16 o extraordinário evento que se iria passar na manhã seguinte.
Ora leiam:

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“A manipulação dos Media pelo Governo não é nada de novo. Mas não é vulgar uma manipulação dos mercados financeiros tão ostensiva como a levada a cabo por Downing Street este fim de semana.

Nos seus briefings com os jornais de Domingo os colaboradores de Theresa May para a imprensa disseram especificamente que o discurso que ela iria proferir na Terça-Feira seguinte seria a causa de uma “correcção de mercado”, e muito provavelmente uma queda do valor da Libra.
Naturalmente, em vez de esperar pelo acontecimento em si, o valor da moeda baixou repentinamente logo na abertura dos mercados cambiais.
Seria inteiramente previsível que a Libra, que reage exageradamente ao mínimo sinal negativo, com este aviso iria sofrer uma quebra súbita de valor. Como seria inteiramente previsível que haveria uma recuperação no momento seguinte. Ninguém sabe isto melhor que os especialistas de Downing Street. O que fizeram foi uma manipulação do mercado de maneira a que, no momento em que a Primeira-Ministra discursava, a libra veria o seu valor disparar. Alguns parágrafos conciliatórios sobre a possibilidade de um acordo com a UE sobre um período transitório pós-Brexit, seria o sinal suficiente para que essa subida dramática ocorresse.
“A Libra sobe enquanto a Primeira-Ministra discursa com dureza sobre o que quer do Brexit.”

Ora digam lá se este não seria um magnifico titulo para os Jornais !”


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Seis meses e alguns dias...

13/1/2017

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                                SEIS MESES E ALGUNS DIAS...


… Se passaram sobre a data do referendo e a vitória do Brexit. Seria razoável esperar que o Governo de S.M. tivesse hoje uma visão clara sobre o que quer da UE e que a Primeira-Ministra fosse vista como sendo uma mão firme ao leme da barca Britânica agora que a turbulência das verdadeiras negociações vai começar, e que não parecesse para muitos dos seus concidadãos como alguém que tenha adormecido ao volante. “Brexit means Brexit”, Brexit significa Brexit, foi a sua palavra de ordem repetida até à exaustão, e quando a vacuidade do sound-byte se tornou insuportável, e o clamor exigindo maior clareza ensurdecedor, veio solicita esclarecer as massas que não haveria nem “Hard Brexit” nem “Soft Brexit”, mas sim um Brexit “Encarnado, Azul e Branco”, afinal um Brexit tingido com as cores nacionais. Perante isto o frémito de pânico que percorreu o país é compreensível, uma vez que entre o Soft e o Hard vai um mundo de diferença: Aquela que medeia entre o continuar a aceder ao Mercado Unico Europeu, minimizando os custos económicos da saída da UE, mas obrigando a manter a livre circulação de pessoas e bens, e o cortar totalmente as amarras e zarpar rumo à Terra Incógnita do comercio sujeito às tarifas alfandegárias da WTO.

Esta questão, a do Soft e do Hard Brexit, transformou os Jornalistas, comentadores e analistas políticos, e a generalidade da população, em aptos leitores dos mais ténues sinais de para que lado pende a balança, mas o mais curioso é que a cotação da Libra esterlina os segue também, esta ora subindo ora descendo, conforme pareça vencer o radicalismo dos defensores do hard Brexit ou o prudente bom-senso daqueles que o preferem na versão soft.

Neste equilíbrio instável, que faz parecer que a Grã-Bretanha irá estar simultaneamente dentro e fora da UE, (Tal como o gato de Schrӧdinger, que estava ao mesmo tempo vivo e morto), qualquer acontecimento é profundamente desestabilizador. Foi o que se passou recentemente quando “o nosso homem” em Bruxelas, o Embaixador Sir Ivan Rogers, se demitiu do cargo após anos no posto, o que o tornava no Britânico com mais profundo conhecimento da organização e funcionamento da UE  numa altura em que a sua experiência era crucial para as negociações que vão começar. Mas Sir Ivan não se limitou a pedir a demissão: Deixou uma carta de despedida à sua equipa que é uma devastadora acusação ao modo como o seu Governo, em particular a Primeira-Ministra, têm conduzido o dossier:

“ ...Espero que continuem contestando os argumentos mal fundamentados e os raciocínios pouco claros, e que nunca receiem falar verdade aos que estão no poder.”

“...Desejo que se apoiem mutuamente nestes momentos difíceis, em que é necessário transmitir opiniões que serão desagradáveis para os que necessitam de as ouvir.”
“...Contrariamente ao que alguns pensam, o comercio livre não acontece apenas pela ausência de regras e regulamentos: O acesso a outros mercados implica acordos multilaterais, plurilaterais e bilaterais que sejamos capazes de firmar, em termos que nos sejam vantajosos.”

Seguiu-se uma vaga de raiva e rancor contra o demissionário pelos defensores do Brexit e rapidamente se soube quem seria o seu substituto: O também Embaixador Tim Barrow, que traz consigo a inestimável experiência de ter sido há anos o titular do cargo em Moscovo.
Realmente só os néscios não verão a genialidade de quem teve a autoria desta mudança.

O mais extraordinário é o facto dos adeptos de Brexit afirmarem constantemente necessitar a Europa mais do Reino Unido, do que o inverso. Invariavelmente é lembrado que a Alemanha exporta 1/5 da sua produção automóvel para a Grã-Bretanha e que sendo Frau Merkel amiga dos “mercados” não quererá matar “a galinha dos ovos de ouro.”

Ainda recentemente Boris Johnson, o incrivelmente Ministro dos Estrangeiros Britânico, disse a Carlo Calenda, o Italiano Ministro da Economia , que a Grã-Bretanha teria de ter acesso ao Mercado Único incondicionalmente, senão a Itália venderia menos espumante Prosecco aos Ingleses, ao que este respondeu : ”Venderemos menos a um país, mas vocês venderão menos a 27!” Foi este o nível a que se chegou.
Mas a desagradável surpresa para os que ufanamente previam que a UE se submeteria à Pax Britannica reside no facto de os 27 estarem unidos no que toca ao Brexit. É verdade que haverá um preço a pagar, mas como se sabe há alturas em que o preço económico é inferior ao político, e esta é uma delas: Permitir a saída de Grã-Bretanha sem custos teria um efeito desagregador para a Europa, preço que nem Merkel estará em condições de aceitar.

Há dois anos atrás a Suíça votou em referendo a imposição de limites à imigração de cidadãos da UE. Não sendo ela própria membro da União, a Suíça acordou respeitar as regras Europeias, entre as quais está a livre circulação de pessoas, para poder beneficiar, entre outras coisas, do acesso ao Mercado Único. Perante a inflexibilidade da UE, e na iminência de pesadas sanções, a Suíça no passado mês assinou um acordo reafirmando a aceitação desse mesmo principio que pretendia abolir.

Este caso ilustra de maneira clara em como o resultado do referendo Britânico dá apenas a ilusão de soberania: Nas negociações que agora se iniciam a Grã-Bretanha depende que o resultado a que se chegar seja aprovado por pelo menos 72% dos Estados membros, representando 65% da sua população, e o prazo limite de dois anos para a negociação, após ser accionado o Artº 50 do Tratado de Lisboa, apenas pode ser prorrogado se isso for aceite pela totalidade dos 27. Acresce que, neste caso, o Parlamento Europeu terá a palavra decisiva. É verdade que o Reino Unido votou pela saída, mas será a União Europeia a decidir como. Se juntarmos a isto o facto que as estimativas mais conservadoras do tempo necessário para que seja assinado um acordo de comercio entre a UE e a Grã-Bretanha é de pelo menos de uma década, teremos a noção do intratável que é o problema que enfrentam os negociadores Britânicos.

A qualquer altura espera-se a decisão do Pleno do Supremo Tribunal de Justiça chamado a pronunciar-se sobre o apelo feito pelo Governo contestando decisão de um Tribunal Superior que impunha a aprovação no Parlamento da invocação do citado Artº 50, sendo a opinião unânime dos observadores que o apelo será rejeitado. Dado a divisão dos Parlamentares entre partidários de Brexit e aqueles que se lhe opõem, que reflecte aliás a divisão do povo Britânico, o resultado é tudo menos previsível.

Esta Terça-Feira Theresa May fará um discurso na Câmara dos Comuns onde dará finalmente conta dos planos e objectivos do Governo para as negociações com a União Europeia, tendo em vista a efectivação da saída do Reino Unido da UE.
Pelo impasse a que se chegou ele deverá ser tudo menos conciliatório, e o anuncio do que haverá um hard Brexit é o mais provável.

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BLOG

6/1/2017

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                                              BLOG

Foi numa noite parecida com esta que em Dezembro de 2013 nasceu a Gazeta do Middlesex:
Agora, como então, um manto de gelo cobre já tudo e, como então, hesito sobre o que escrever.
Fui ver: O primeiro post foi apropriadamente uma carta de Séneca a Paulino sobre a brevidade da vida e como delapidamos o tempo que nos resta. Breve não foi afinal a existência da Gazeta, que entra no quarto ano de publicação para grande surpresa minha. Tento lembrar-me das expectativas que teria nesse momento e não recordo nenhumas, aparte aquela referencia ao auto retrato de Salvator Rosa na National Gallery, onde se lê a máxima “Aut tace aut loquere meliora silentio”, (mantém-te calado a menos que o que digas seja melhor que o silencio), uma promessa que tristemente agora vejo que foi vã, como se pudesse alguma vez escrever algo de valia que ressoasse para além deste canto do Middlesex onde laboriosamente vou juntando estas linhas. Tal como Guido, o personagem do filme 81/2 de Fellini, aquele realizador de cinema que falho de inspiração resolve fazer da história da sua vida o motivo do seu filme, o que levou o grande crítico Daumier a escrever: ” Mas que monstruosa presunção essa a de acreditar que alguém possa tirar algum beneficio desse esquálido catálogo de erros que foi a tua existência ! E que bem te poderá vir de teres alinhavado esses farrapos da tua vida, essas tuas vagas memórias…?”

É certo que foi Ésquilo que disse ser a memória a mãe de toda a sabedoria, mas não encontro nenhuma, nem nenhum nexus, naquilo que vou publicando: Os meus amigos dizem que sou um bom raconteur, mas não é nada de especial ter algumas histórias para contar, quando se tem uma vida que já vai longa como a minha. Tenciono continuar, testando a paciência de quem aqui vem, esses leitores que desconheço quem sejam e onde estão, mas cuja existência pressinto, e que são afinal a razão da existência da Gazeta.

Foi Simone Weil que falou em dois prisioneiros que ocupavam duas celas contiguas de uma Penitenciária e que aprenderam após muito tempo a comunicar entre eles batendo na parede. “Essa parede era aquilo que os separavam, mas também o seu meio de comunicação. Toda a separação é um elo de ligação.”
Portanto, caros leitores, este blogue é a minha parede, e nela vou continuar batendo. Batendo e escutando.

Feliz 2017 !



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