A GAZETA DO MIDDLESEX
OS CONHECIDOS DESCONHECIDOS
(ou o problema da Irlanda)
“...Os Relatórios que concluem que alguma coisa prevista acabou por não acontecer sempre me interessaram porque provam que existe aquilo que sabemos que sabemos. Também existem os conhecidos que são desconhecidos; quando sabemos que há coisas que não sabemos. Mas também há os desconhecidos que são desconhecidos – quando não sabemos que não sabemos...”
https://youtu.be/GiPe1OiKQuk
Donald Rumsfeld – Secretário de Estado da Defesa dos Estados Unidos (Numa conferencia de Imprensa em 2002 tentando esclarecer porque razão os Estados Unidos estavam enganados sobre a existência de armas de destruição maciça no Iraque.)
Com pezinhos de lã, no meio do charivari do Brexit, vai surgindo o problema da Irlanda, ou melhor, o como resolver o problema da Irlanda, problema esse que constitui um conhecido que é desconhecido, citando as imortais palavras do Secretário Rumsfeld. Para já temos as duas Irlandas: A da Republica e a da do Norte, esta ultima fazendo parte do Reino Unido, (Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte).
Presentemente, com ambas pertencendo à UE, e depois das dificílimas negociações de paz entre Católicos e Protestantes, a região conheceu um largo período de calma e prosperidade em parte devido ao desaparecimento das fronteiras que separavam as duas Irlandas.
Mas com o Brexit tudo muda: A da Republica continua na UE, mas o Norte sai. Segundo os tratados Europeus nenhum Estado membro que tenha fronteiras com outro que não pertença à União pode permitir o livre transito de pessoas e bens nessas fronteiras. Logo seria necessário reintroduzir barreiras físicas separando a Irlanda Republicana da Unionista. Sabe-se que a medida teria custos políticos e económicos tremendos, ainda para mais se nos lembrarmos que a Irlanda do Norte, como a Escócia, votou maioritariamente no referendo por permanecer na União Europeia. Isso é o conhecido, mas o que não se sabe é até que ponto a decisão seria aceite pacificamente pela população de ambos os lados da futura fronteira. (É a parte desconhecida do conhecido).
Mas, e se por hipótese não existisse controle fronteiriço ? Na situação mais do que provável de não haver acordo de comercio entre as partes Britânica e Europeia, então teriam de ser introduzidas pautas aduaneiras. O que seria facílimo de tornear numa espécie de contrabando consentido: Os bens produzidos em Inglaterra seriam transportados para a Irlanda do Norte e daí para a Republica, e uma vez lá poderiam livremente circular para qualquer parte da UE sem pagar direitos.
No que toca ao livre transito de pessoas os problemas ainda seriam mais graves: Com severas restrições à entrada na Grã-Bretanha de imigrantes vindos da UE, quem quisesse iludir essas restrições bastar-lhe-ia apanhar um avião para Dublin e depois outro de Belfast para qualquer ponto de Inglaterra. A deportação em massa de cidadãos comunitários levantaria à Inglaterra tais problemas legais, políticos e logísticos que não se afigura uma possibilidade viável. Logo, para quê o Brexit ?
Timidamente vai-se sugerindo o que era até há pouco impensável : Se a Republica da Irlanda saísse da UE então terminavam os problemas da fronteira com o Reino Unido, (destino de 40% das suas exportações), mas abria-se um problema ainda maior para o comercio com a Europa. Mas, e se fosse a Irlanda do Norte a integrar-se na Republica ? Tornando-se ambas um só país, uma velha aspiração de 40% da população do Norte, resolviam-se todos os problemas, menos a da feroz lealdade à Coroa Britânica dos restantes 60% dos Norte Irlandeses.
A tudo isto acresce que nos últimos anos o Governo da Irlanda do Norte resultou de um acordo de partilha do poder entre o Sinn Fein republicano e o DUP, (Democratic Unionist Party), partidário da ligação à Coroa Britânica, acordo que soçobrou recentemente no meio de recriminações mútuas. Com eleições marcadas para a próxima Quinta-Feira delas não se espera uma solução de governo viável, restando recorrer à velha formula do Direct Rule que consiste na Irlanda do Norte ser governada directamente pelo governo de Londres, o que trás à memoria o terrível período violência sectária que tantas vidas custou.
Segundo as preclaras palavras do ilustre Donald Rumsfeld, o futuro que nos aguarda não passa portanto do desconhecido que é desconhecido.