A GAZETA DO MIDDLESEX
ASSASSINATOS
Judeu, Ralph conseguiu escapar ao avanço das tropas nazis apanhando o último barco a sair de um porto da sua Bélgica natal e refugiar-se em Inglaterra. Tinha apenas dezassete anos quando aqui chegou só e sem nada e imediatamente alistou-se como voluntário na Royal Navy, onde combateu durante a guerra. Como jovem judeu numa Europa esmagada pelo fascismo e nazismo, encontrou no Marxismo uma resposta à catástrofe que ameaçava a civilização. Nos anos trinta e quarenta quantos, jovens e menos jovens, não encontraram nessa ideologia uma esperança libertadora? Mais tarde, acabada a guerra, veio a ter uma distinta carreira académica sempre orientada na defesa de uma sociedade sem classes nunca tendo deixado de defender a sua matriz marxista, ao mesmo tempo que publicava obra denunciando os crimes do regime Estalinista.
Pois o Daily Mail, nesse artigo publicado sob o titulo “ O Homem que odiava a Grã-Bretanha” e que é acompanhado por uma fotografia de Ralph pouco antes da morte, em que aparece com os seus filhos David e Ed ainda crianças, desenterra um pequeno texto escrito numa publicação esquerdista logo após ter chegado, onde criticava o tipo de sociedade em que vigorava um sistema rígido de divisão por classes, como era a sociedade britânica da epoca. Segundo o Daily Mail, Ralph Miliband demonstrou então que “Odiava a Rainha”, que “Odiava o Exército” e sobretudo “He hated Britain!”.
A pasquinada do Daily Mail provocou uma profunda onda de indignação, com mais de 70% da população a condenarem o jornal segundo vários inquéritos realizados. Colegas professores universitários, e o próprio autor da biografia de Ralph, denunciaram a grosseira mentira do jornal e dois dos mais proeminentes antigos ministros do Governo de Margaret Thatcher, Lord Moore e Lord Haseltine, vieram a público desmentindo a calunia e defendendo a memória de Ralph Miliband. Mas é verdade que outros se conservaram num silencio hipócrita na esperança de vir a ganhar com a injuria. O próprio Daily Mail recusou-se a apresentar desculpas, defendendo o artigo como sendo um estilo de “jornalismo robusto” perfeitamente admissível e que “O povo britânico tinha o direito de saber o que o pai do candidato a Primeiro-Ministro pensava, sobretudo por o filho ter sido muito amigo dele.”
Ed Miliband veio às televisões denunciar a afronta possuído por uma profunda indignação e poucas vezes neste país, onde se é tão avesso a publicamente exibir as emoções, alguém, e muito menos um político, terá tão livremente mostrado o que lhe ia na alma. Como, perguntava Ed Miliband, poderia o meu pai odiar este país se foi a Inglaterra que o salvou do holocausto e se pela Inglaterra combateu durante a guerra ?
Portanto não há limites para a baixeza moral : Neste caso querendo-se atacar o filho calunia-se o pai falecido há décadas, noutros fazem-se continuadas campanhas ad hominem, verdadeiros assassinatos de carácter, como que para nos lembrar que abaixo da sarjeta ainda há o esgoto, onde habitam aqueles que, por não terem quaisquer escrúpulos morais, são capazes de tudo. Pelos vistos reproduzem-se facilmente e já chegaram a Portugal onde crescem e prosperam.