A GAZETA DO MIDDLESEX
ICARUS
Baltasar Garzón
e
Elpidio José Silva
Quem já não ouviu falar de Baltasar Garzón, o primeiro verdadeiramente Super-Juíz da História Moderna? (Pilatos obviamente não conta).
Garzón reclamou para si a faculdade de possuir jurisdição universal, vendo-se a si próprio como um novo Josué da Bíblia, aquele que fez derrubar as muralhas de Jericó com o som das suas trombetas, mas agora usando a força da Lei de que se julgava o supremo interprete.
Entre muitos outros casos que deram brado ficou famoso o seu pedido de extradição para Espanha de Pinochet, aproveitando uma visita deste ao Reino Unido. O próprio Kissinger foi intimado a apresentar-se para interrogatório e no tempo de George Bush foram seis os altos membros da Administração americana, incluindo o Vice-Presidente Dick Cheney, a serem também objecto de pedidos de extradição para responderem perante ele a acusações várias.
Nada parecia impossível para Garzón cuja fama, essa sim, se tornou universal. Se houvesse um Óscar para o melhor Juiz aí o teríamos anos a fio em Hollywood desfilando na passadeira vermelha e sob os holofotes para receber a estatueta dourada.
Um dia porém ordenou a prisão de varias personalidades ligadas ao PP sob a acusação de corrupção, naquilo que ficou conhecido como o caso Gurtel. Foi também por ordem sua que foram instaladas escutas na prisão de modo que pudessem ser gravadas as conversas entre os detidos e os seus advogados, o que constituía obviamente uma grave ilegalidade.
Acusado, foi julgado por uma painel de sete Juízes do Supremo Tribunal e condenado a uma pena de 11 anos de impedimento das funções de magistrado e ao pagamento de uma multa de 2.500 Euros. Segundo o Acórdão do Supremo “Garzón utilizou métodos que são próprios de países totalitários e sem qualquer respeito pelos direitos da defesa”.
E assim acabou a carreira do Super- Juiz e estrela mediática.
O caso de Elpidio José Silva é em tudo semelhante ao de Garzón: Desta vez foi a prisão de Miguel Blesa, ex- presidente da CaixaMadrid, igualmente sob a acusação de corrupção .
Porém as justificações para a prisão de Blesa foram de tal modo sem fundamento que Elpidio José Silva acabou também acusado e julgado pelo Supremo. O Tribunal considerou que as razões para prender Blesa “tiveram motivações insólitas” e que o Magistrado demonstrou pela maneira como conduziu o processo “uma absoluta falta de competência” ao evocar fundamentos para a prisão que “são um completo disparate jurídico”. Disse ainda o Tribunal no seu acórdão : “O Juiz Silva não podia ignorar que uma prisão preventiva decretada nessas circunstancias era de raiz contrária ao Direito, arbitrária e sem justificação possível.” e que ao “demonstrar ter nenhuma consideração pela lei , teve uma acção de tipo inquisitorial destinada unicamente a tentar encontrar algum ilícito que pudesse imputar ao acusado.”
Para Elpidio José Silva a pena aplicada pelo Tribunal, dezassete anos e meio de suspensão das funções de Magistrado, foi significativamente mais pesada daquela que sofreu Garzón mas ambas, devido às respectivas idades, significaram na prática a expulsão da carreira judicial.
“No melhor pano cai a nódoa”, é o que somos levados a pensar quando postos perante estes acontecimentos, tentando esquecer que qualquer um pode ser vitima de um abuso de poder e que afinal “tudo está bem quando acaba em bem.”
Na realidade, se a Justiça nestes casos acabou por triunfar, uma pequena incerteza fica a roer-nos por dentro: Será que vai ser sempre assim e em todo o lado ?