A Gazeta do Middlesex

Pensar II

13/2/2015

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                       A  GAZETA  DO  MIDDLESEX



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                                              PENSAR II

(continuação)

O combate à blasfémia foi sempre um meio que os déspotas usaram para legitimarem o seu poder, como ficou claramente demonstrado em 1989 quando os Iranianos declararam uma fatwa contra Salman Rushdie pela publicação dos Versos Satânicos, no que não foi uma acção isolada levada a cabo pela hierarquia religiosa na tentativa de silenciar a expressão criativa. Leis contra a blasfémia existem em muitas partes do mundo Muçulmano, frequentemente implicando penas draconianas para quem as infringem. Um relatório publicado em 2013 pela International Humanist and Ethical Union revela que os apóstatas e blasfemos incorrem na pena de morte em 13 países, todos eles Muçulmanos: Afeganistão, Irão, Malásia, Maldivas, Mauritânia, Nigéria, Paquistão, Qatar, Arábia Saudita, Somália, Sudão, Emirados Árabes Unidos e Iemen.

Enquanto em Paris prosseguia a caça aos assassinos do Charlie Hebdo, na Arábia Saudita um blogger, Raif Badawi, era condenado a sofrer 1.000 chicotadas e a cumprir uma pena de 10 anos de prisão bem como ao pagamento de uma multa de £175.00 por ter supostamente insultado o Islão. A Mulher de Badawi, Ensaf Haidar, declarou ao The Guardian, “O Governo Saudita comporta-se como o Daesh ( designação pejorativa em árabe para o EI).”

Começa assim a esbater-se a diferença entre os nossos aliados – como os Sauditas- e os nossos inimigos como o EI. Ambos aplicam uma política de estrita observância na aplicação de penas capitais sobre quem alegadamente tenha proferido insultos contra o Islão ou contra o seu Profeta. E não são os únicos.

Durante 16 anos, a até agora chamada Organisation of the Islamic Conference, presentemente designada Organisation of Islamic Co-operation (OIC), tentou fazer aprovar na UN legislação proibindo a “difamação” da religião, o que redundaria na ilegalização internacional da blasfémia.

Em 2011 no Paquistão, o então Governador do Pujab, Salman Taseer, ousou propor a reforma das leis anti-blasfémia o que foi suficiente para que fosse assassinado pelo seu guarda-costas, Mumtaz Qadri. Mas o mais deprimente foi o facto de ter sido declarado herói nacional não a vitima mas o criminoso. “O assassino do meu pai,” escreveu Aatish Taseer num artigo publicado no Telegraph, “foi recebido com uma chuva de pétalas de rosa.”

Algumas comunidades Muçulmanas Britânicas estão envolvidas nestas práticas. Na altura em que foi morto, Taseer estava envolvido na defesa de uma mulher de nome Aasia Bibi, pertencente à minoria Cristã, e que tinha sido acusada de blasfémia. O caso provocou acesa polémica no Paquistão e quando o denunciante revelou a intenção de desistir da queixa foi uma organização Britânica, a Khatm-e-Nubuw-wat Academy, ( o que significa em árabe “a finalidade do Profeta”), que o convenceu a prosseguir. O jornal do Paquistão Express Tribune revelou que vários membros da Khatm-e-Nubuw-wat se deslocaram propositadamente a esse país para garantir que Bibi fosse “perseguida até ao inferno” e que disponibilizaram os fundos necessários à acusação.

Este tipo de atitude persiste há décadas. Quando a fatwa contra a vida de Salman Rushdie foi proclamada, praticamente todas as organizações Muçulmanas da Grã-Bretanha apoiaram a medida. Iqbal Sacranie, que mais tarde foi líder do Muslim Council of Britain e feito Sir em 2005, disse “A morte é provavelmente um castigo demasiado benevolente para ele...” Mais recentemente Sacranie confessou estar arrependido do que disse, mas o mal estava feito.

Em ambos os casos anteriormente mencionados, na Arábia Saudita e no Paquistão, os lideres e grupos religiosos tiveram um papel importante, mas quem formulou as acusações foi o Estado.

Na realidade são os próprios Estados Muçulmanos a alimentar a hostilidade contra a apostasia, e são esses mesmos Estados que tentaram e tentam introduzir leis que proíbam todo e qualquer debate sobre o Islão e que condenam aqueles que internamente ousam fazê-lo.

Não causará portanto surpresa que, quando o Profeta Maomé é objecto de sátira no Ocidente, o facto devido ao clima entretanto criado cause uma fúria incontida no mundo Muçulmano, sem que ninguém do seu interior tenha surgido com suficiente autoridade moral para se ter oposto ao assassinato dos cartoonistas do Charlie Hebdo.


Shiraz Maher




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