A GAZETA DO MIDDLESEX
A ESQUERDA RADICAL GREGA PODE PÔR FIM
À POLITICA DE AUSTERIDADE NA EUROPA
OWEN JONES
Uma outra guerra parece estar iminente na Europa: Travada não com espingardas ou tanques, mas através dos mercados financeiros e dos diktats da União Europeia. Uma Grécia devastada pela austeridade pode estar perto de uma eleição geral capaz levar ao poder um Governo claramente oposto a essa política. Seria um acontecimento decisivo: Nunca, nos seis anos de cortes e de queda dos níveis de vida que se seguiram ao colapso do Lehman Brothers, tal coisa aconteceu.
Mas se o partido de esquerda radical Syriza vencer as eleições antecipadas no inicio do ano, haverá certamente um movimento concertado para destruir a experiência logo no inicio. O que terá repercussões não só na Grécia, mas também em todos aqueles que querem um tipo diferente de Sociedade e um alteração das políticas de austeridade.
E que miséria foi imposta à Grécia! Um em cada quatro cidadãos está no desemprego; A população abaixo do nível de pobreza subiu de 23% antes da crise, para os actuais 40.5% ; os serviços públicos essenciais, tais como a Saúde, sofreram enormes cortes, e numa altura em que se tornaram ainda mais necessários. Não deve causar admiração que a sociedade grega se tenha radicalizado, sendo que a presente situação é muitas vezes comparada com a vivida na Alemanha durante a República de Weimar.
Os neo-nazis da Aurora Dourada - que fazem com que outros movimentos de Direita pareçam ser moderados liberais – conseguiram em certo momento 15% dos votos - felizmente que, apesar de ainda constituírem uma ameaça, o seu apoio popular caiu entretanto para metade.
Mas ao contrário do que aconteceu noutros países Europeus – com a notável excepção da Espanha e da Irlanda – aqui a fúria e o desespero com a austeridade foram canalizados para os partidos populistas de esquerda. Depois de anos nas margens da política grega, o movimento Syriza, que apenas se constituiu em partido político em 2012, não obstante foi capaz de ganhar as eleições europeias deste ano. As sondagens dão ao Syriza uma substancial vantagem sobre o partido de centro-direita Nova Democracia que governa actualmente o país. Pela primeira vez na história da União Europeia um governo de esquerda radical pode conquistar o poder.
Após anos de ruína, o Syriza oferece aos gregos uma coisa preciosa: Esperança. Embora tenha deixado de pedir o cancelamento da divida publica, exige contudo a sua renegociação, apresentando o exemplo do que aconteceu em 1953, quando uma cimeira europeia acordou em perdoar parte da divida da Alemanha. O seu manifesto eleitoral propõe que o pagamento seja feito através do crescimento económico, em vez da realização de cortes orçamentais.
Defende um programa Europeu apoiado por um Banco de Investimento; uma guerra à fuga aos impostos, problema endémico na sociedade grega; um programa de emergência para a criação de emprego; um aumento do ordenado mínimo; o regresso às negociações colectivas. Em aliança com outras forças anti-austeridade, como o Espanhol Podemos, o Syriza defende que a UE deve abandonar as políticas ruinosas de austeridade em favor da injecção massiva de capital na economia e da adopção de políticas favorecendo o crescimento económico.
Existe porém um obstáculo: A oposição determinada do poder político, quer na Grécia quer na União Europeia. Este país foi governado por uma junta militar de extrema-direita entre 1967 e 1974, existindo ainda um entranhado sentimento anti-progressista em vários níveis do Estado. A policia foi infiltrada por elementos pertencentes à Aurora Dourada, e foi denunciada a existência de casos de tortura levados a cabo por policias sobre elementos anti-fascistas. O Governador do Banco da Grécia avisou para os “danos irreparáveis” na economia se houvesse uma mudança de rumo. Uma espécie de golpe de estado mais subtil do que aquele que foi levado a cabo pelos Coronéis, parece não ser de excluir.
Além do mais, existe ainda o Presidente da Comissão Europeia Jean-Claude Junker, um homem que dificilmente pode reclamar possuir um inspirador mandato democrático, sendo conhecido por ter promovido políticas de fuga aos impostos no seu país , e que já declarou publicamente que o povo Grego não devia votar “de maneira errada” - “Penso que os Gregos – que têm um estilo de vida muito diferente – sabem perfeitamente o que uma eleição errada significaria para a Grécia e para a Eurozona,” disse ele. “Não gostaria que forças extremistas subissem ao poder,” acrescentou. Correm rumores que, no caso de vitória do Syriza, a Grécia poderia ver-se privada dos fundos europeus. Imagens apocalípticas de fugas de capitais e corridas aos Bancos são frequentemente evocadas.
Os Mercados e as elites políticas apontaram portanto as suas armas ao eleitorado grego.
A direcção do Syriza tem no entanto críticos na sua ala esquerda, os quais citam a opinião do Professor de Economia Costas Lapavitsas, da London's School of Oriental Studies, segundo a qual o programa do Syriza não é possível de ser executado dentro dos limites impostos pela União Monetária. Os propósitos de mudar a UE são uma ingenuidade, diz ele, mas que permite que seja dito às pessoas que “podem ao mesmo tempo ter o bolo e comê-lo”, o que é conveniente dado que a maioria dos Gregos, apesar de tudo o que lhes aconteceu, não deseja sair do Euro. O professor Lapavitsas acredita que esteja para breve uma confronto entre o Syriza e a UE, e que a Grécia será vitima de chantagem e possivelmente de uma “pressão mortal” por parte do Banco Central Europeu, que poderia estrangular o sistema financeiro grego numa questão de dias. A “Grexit”, (como é conhecida nos países anglo-saxónicos a saída da Grécia do Euro – n.t.), poderá vir a acontecer, quer a direcção do Syriza queira quer não.
Esta é a razão porque a Grécia necessita desesperadamente de solidariedade. Em primeiro lugar por uma questão de principio; é necessário defender a sua soberania e democracia de ataques venham eles do interior ou do exterior. Mas um Governo do Syriza serviria de estimulo a outros movimentos anti austeridade do continente europeu. Pode-se imaginar que em Espanha o Podemos possa estar em condições de subir ao poder pelos finais de 2015. Movimentos semelhantes ao Die Linke da Alemanha- país que está no centro das políticas de austeridade- receberiam um incentivo também. Aqui na Grã-Bretanha o Syriza representa um sério aviso ao Partido Trabalhista: O crescimento desse novo Partido na Grécia tem a ver com o comportamento do Pasok, Partido irmão dos socialistas Britânicos, por ter enquanto Governo imposto uma feroz política de austeridade, cujo resultado foi colher hoje apenas 5% das intenções de voto. No Reino Unido, algumas sondagens dão já aos Verdes cerca de 9% dos votos, mesmo antes dos Trabalhistas ganharem as próximas eleições e de começarem a aplicar as suas próprias medidas de austeridade.
Inquéritos à opinião, feitos pelo Instituto Ipsos-Mori, dão conta que 27% acham que o Labour tem políticas equilibradas no que toca aos gastos públicos, mas 26% pensam que irão efectuar demasiados cortes. Uma vitória eleitoral do Syriza poderia reforçar a posição dos que pretendem que o Partido Trabalhista ofereça uma verdadeira alternativa ou, no caso do sistema eleitoral mudar, seja possível na Grã-Bretanha a criação de um Partido semelhante.
Portanto 2015 pode ser ao ano em que finalmente a austeridade vai a julgamento perante os cidadãos europeus. Ou pode, em alternativa, ser o ano em que a oposição democrática a estas políticas de loucura económica seja derrotada. È um jogo cujos resultados serão fundamentais para o futuro de milhões de pessoas.
Owen Jones (Sheffield, Inglaterra 1984- )
Escritor- (Master in History, Oxford University)- autor do livro “Chavs: The Demonization of the Working Class”, considerado pelo New York Times como uma das melhores obras de 2011.
Colunista, assina regularmente artigos de opinião no The Guardian, The Independent, New Statesman, Sunday Mirror e Le Monde Diplomatique.