A GAZETA DO MIDDLESEX
UM "AUTÊNTICO BRITISH"
Mas no artigo o único fundamento apresentado para a Britishness do Juiz consiste no facto de ele ser “cordial”. Ora se eu no passado encontrei razões para pensar que o referido periódico era por vezes, digamos, económico com a verdade, agora tenho de dar a mão à palmatória: Os Juízes Britânicos são realmente “cordiais”, como cordiais e sorridentes são os policias, (que andam desarmados), o pessoal que nos revista as bagagens no aeroporto, os estudantes universitários mais velhos que dão as boas vindas aos caloiros, etc, e de uma forma geral todos aqueles que numa posição de autoridade, oficial ou não, lidam com os outros.
Esta Sociedade tem por certas profissões, que são de grande importância para a vida colectiva, tais como Juízes, Professores, Militares e Médicos, elevado respeito e consideração.
Isto não quer dizer que a autoridade não seja exercida: No caso dos Tribunais a Justiça é fulminante e implacável e as penas severas para quem prevarica. Nem podia ser de outra maneira num país onde não existe nenhum documento de identificação e ninguém, salvo com poderosas razões, se atreve a duvidar da palavra de um cidadão.
Diz-se com graça que os Juízes Britânicos impõem a ordem nas suas salas de audiências com as sobrancelhas: Do alto da sua tribuna, que simboliza a supremacia da Lei, normalmente o levantar das sobrancelhas pelo Juiz faz calar os mais atrevidos. Já Ted Roosevelt dizia que quem exerce o poder deve falar suavemente tendo ao mesmo tempo um grande varapau na mão .
Outra característica interessante é a de que os inquéritos judiciais recebem oficialmente o nome do Magistrado que os preside. Aqueles a quem toca isso em sorte, o saber que o seu nome ficará ad aeternum ligado à investigação, é algo capaz de tornar o Juiz em causa, já de si idóneo, ferozmente independente e impermeável a qualquer tipo de pressão.
O Inquérito Leveson, (de Brian Leveson, de seu titulo completo Lord Justice Leveson), investigou o chamado escândalo das escutas telefónicas. Rupert Murdoch, o homem mais poderoso da Grã-Bretanha, o príncipe negro da política, aquele que sem cujo apoio nenhum candidato a Primeiro-Ministro podia realisticamente aspirar a ganhar as eleições, foi a figura central.
Dono de um império dos media teve um dos seus jornais, o News of the World, no centro do furacão e quando a investigação judicial terminou, após terem sido ouvidas centenas de vitimas, esse jornal tinha sido encerrado, vários réus cumpriam pena e o império de Murdoch tinha sido deitado por terra e o país respirou mais livremente.
Outro Inquérito, este ainda em curso, é o Inquérito Chilcot, (Rt. Hon. Sir John Chilcot), que investiga a participação do Reino Unido na invasão do Iraque e cujos resultados viram a sua divulgação publica recentemente vetada pelo actual Governo Conservador e cuja principal figura, quer queiramos quer não, e que está a ser julgada in absentia, é o antigo Primeiro-Ministro Tony Blair.
Portanto há que desejar ao Juiz do caso Sócrates, a quem não fica mal parecer British, mas que tem certamente muito mais qualidades do que a bonomia do trato, muita sorte, reconhecendo que o lugar que ocupa pode ser um dos mais solitários do Mundo.